sábado, 18 de julho de 2009

NOSSOS


Seja Homem, não Pai

Me tome como Mulher, não Filha,

mas não como Tua mulher

Não sou Tua, assim como não és Meu.

Não seja Meu.

Costumo não saber o que fazer com Minhas Coisas,

onde as deixo,

onde as guardo,

por que já não me servem...

perco o interesse nelas logo após a aquisição.



Eu sou Minha.

Você Teu.

Não temos outros Donos.

Não se dê a mim.

Entregue-se.

Nesse momento entregarei-me a Ti,

então, seremos Um.

Seremos Nossos.



Mirla Menezes

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Devir

Assistia desinteressado ao programa sobre a formação e hierarquia em uma colônia de formigas quando, olhando bem para a tela do aparelho de televisão, descobriu uma nódoa, pôs-se a pensar o que teria deixado aquela mancha que ele não conseguia remover, mesmo quando esfregava o dedo com força. Enquanto esfregava o anelar da mão direita com força contra a fria superfície do eletrônico lembrou-se o que, mesmo já não existindo e já não mais esvoaçando ao seu redor, deixara ali sua marca, o indício de sua passagem, seu signo. Um mosquito. Como um pequeno e infame mosquito poderia deixar marca tão forte, tão aderente e tão incomoda?, pensou consigo, como algo tão insignificante pôde tirar sua atenção do programa e encaminhá-la para a tela de seu televisor novo, com 49 polegadas, como aquele ser infecto se atrevera a morrer ali e ainda, assim, em morte incomodá-lo?
Enquanto refletia sobre o atrevimento do inseto, sua pequena sobrinha, com cerca de quatro anos, parou de brincar com seus lápis de cores e ficou a observar o tio em sua pesquisa, que tipo de coisa faria com que ele ficasse tanto tempo com a face tão perto da televisão e a observando de maneira tão atenta?, seria esse o pensamento da criaturinha se tivesse idade o suficiente para formulá-lo. Passado alguns poucos minutos aproximou-se dele e começou a observá-lo melhor, sem que ele percebesse, notou que ele não fazia nada mais que olhar para uma sujeira na tela de sua TV, coisa sem importância.
Ele esfregava freneticamente seu dedo anelar sobre a nódoa, esfregava e esfregava, enquanto pensava que seu novo televisor iria ficar, já tão cedo, com uma mancha, e começara a se perguntar porque matara aquele inseto ali, poderia tê-lo mandado para longe, tangido, afastado, mas não; em sua fúria por ter sido incomodado, durante um Fla-Flu nem pensou na conseqüência de seu ato.
Uma mancha enorme, porque a esta altura ela já estava tomando toda a sua alma, tirando a sua paz, por um momento impensado perdia sua tranqüilidade naquela tarde de domingo, parou, respirou e quando pensou em pegar uma esponja e água para lavar a tela do aparelho, percebeu que muitos atos impensados na vida trazem nódoas que duram muito, mas muito tempo mesmo, algumas eram até impossíveis de tirar, crônicas, eternas, lembrara que muitas vezes dissera palavras duras a entes queridos e que mesmo com um pedido de desculpas elas não desapareciam, não havia alvejante que desse conta. E ele? quantas vezes não tinha ouvido palavras ou ainda sofrido ações que lhe jogaram lama no coração e pior no orgulho?, esse nunca se permitira lavar. Pensando bem, não tinha motivo algum para matar aquele mosquito, afinal, o animal nada lhe fizera, só estava seguindo o seu instinto, tentando fazer o reconhecimento do local, do novo ser que encontrara. Deus o que fizera? tirara a vida de uma inocente criatura, escandalizado com sua atitude e percebendo agora que seu rosto refletia na TV, sussurrou para si “assassino”, olhou para os lados e tão desconfiado estava não notou que a criança o observava cada vez mais curiosa, segurando um dos seus lápis na mão esquerda ela esperava que ele se afastasse do televisor e voltasse a normalidade. O tio absorto em seus pensamentos cria agora que era um monstro, um covarde. Afinal, matara um pobre e indefeso mosquito, o que estaria agora fazendo aquela frágil criatura se ele não a tivesse matado? Que ser vil ele se revelara, dava graças aos céus por sua boa mãezinha não ter vivido para ver aquele momento e se martirizava agora pela vida do ser que, há dois minutos, maldizia a existência.
Dando-se conta da presença da menina recolhe seus pensamentos assustado e vê a pequena aproximar-se de seu objeto de louvor, pôr o dedo indicador na boca, umidecê-lo, esfregar levemente a tela da TV e voltar a brincar no canto da sala com seus lápis coloridos; em dois segundos a tela voltou a reluzir, sem demonstrar que fora em algum momento, um instante sequer, molestada, maculada, enodoada pelos restos mortais do mosquito. Ele olha para aquilo incrédulo, como não cogitara isso antes? Recostou-se no sofá, apanhou o controle remoto e pensou: “Maldito mosquito me fez de bobo, mereceu morrer”.

Mirla Menezes

segunda-feira, 13 de julho de 2009

E agora?

Odeio o sol

Ele tenta te mostrar quem sou;

quem não sou;

quem acham que sou;

só não me mostra.

Tão inútil, nessa passividade de coisa.

Sem trabalho, sem função.

Objeto.



Enquanto a noite...

Ah!!! a noite...

Ela permite que eu me invente, reinvente,

que seja contraditória e tente novamente não ser eu.

Posso trabalhar em mim,

obreira,

construir,

me fazer,

refazer,

me moldar.



Já tentei não ser ela, não ser eu, não ser você

até não ser, já tentei.



E pelo avesso tento te mostrar quem sou

Me desvaneço aos seu pés e me mostro

Me escondo, me ponho ao certo, ao contrário...

Me viro.



E você nada vê.



Mirla Menezes