quinta-feira, 21 de abril de 2011

Frugal



Conheceram-se em uma rede de relacionamentos virtuais, ele com o nome no aumentativo, às vezes usava um apelido íntimo, ela com o nome no diminutivo e também, com maior frequência que ele, usava um apelidinho dado pelas amigas. Ficavam ambos horas por dia atualizando os perfis, ela gostava de letras em negrito e de postar poemas que a definiam, ele gostava mesmo era de postar suas preferências musicais, literárias e fotos, sempre de baladas.

Ao ver o perfil dela com uma belíssima foto, claramente modificada com photoshop, no perfil de um amigo em comum, ele, como sempre muito amigável, fez o favor de convidá-la para fazer parte de sua rede de amigos, ela, vendo-o em foto que valorizava muito seus atributos físicos, logicamente, adicionou-o.

Iniciaram a conversa por ali mesmo, sempre muito cordiais e mostrando-se interessados no bate-papo real, porém com o passar de alguns dias – que no mundo virtual pareceram séculos – decidiram ir para a sala de mensagens instantâneas, lá perceberam que as fotos um do outro do site de relacionamento poderiam tê-los enganado um pouco, mas que davam para o “gasto” mesmo assim. Conversaram dias, por horas a fio, durante algumas semanas, ela falava para todas as amigas sobre o carinha interessante que tinha conhecido na net, ele falava para todo mundo que agora saía pouco porque em casa tinha coisa mais interessante para fazer.

Já haviam conversado tudo o que de superficial poderia existir quando decidiram trocar telefones. ( Você não tem ideia do quão difícil é sair do virtual para ter o menor contato real com a outra pessoa!) Ele ficou de ligar, ela esperou. Quando o telefone chamou, ela prontamente atendeu e esperou sofregamente a voz que vinha do outro lado, uma voz máscula, suave e com requintes de educação do mais alto nível soou dizendo “ e aí?” e ela respondeu “tudo bem?”, o problema de falta de sintonia foi logo resolvido no primeiro minuto de fala, mas o problema sobre o que conversar, não.

Como seria muito mais difícil conversar por telefone decidiram se encontrar, marcaram no shopping, reduto de toda a gente que se conhece na rede e quer de maneira “segura” conhecer quem tecla lá do outro lado.

Encontraram-se, ela de saia rosa e blusa branca, completamente envergonhada. Ele de cabelo da moda e tênis caro, super seguro de que pegaria mais uma gatinha naquele fim de tarde de sábado.

Não se pode dizer o que foi maior, se a vergonha por já terem gasto todo o arsenal de assuntos e ter que repeti-los pessoalmente ou de ver que a perfeição só ficava mesmo nas fotos modificadas. A tal atração física e intelectual que os movia pela rede já não era tão atrativa, mesmo assim, decidiram cada um por si e sem comunicar ao outro que ficariam naquele dia. Após terem se acostumado com as vozes, com os gestos e até de ter alguma confiança no outro decidiram sair daquele lugar e irem para outro um pouco mais aberto, porém com menos pessoas.

Depois de muita conversa jogada fora e muita informação repetida deram o primeiro beijo, pensando cada um lá consigo como seria, não foi lá grande coisa, mas até que deu para ir aperfeiçoando após darem umas sequências intermináveis que deixaram os mais velhos envergonhados.

Ela voltou para casa quase apaixonada, ele com a maravilhosa sensação de que tinha feito um gol. Ela muito fofinha colocou até frase romântica no subnick, ele, agora, sempre estava com o status de ocupado.

Saíram mais algumas vezes, nunca se apresentaram aos amigos um do outro, ela já estava se sentido um pouco mais atraída quando ele revelou que não estava mais a fim. Daí em diante toda a doçura acabou. No subnick dela somente mensagens vingativas e desaforadas e no dele as famosas frases de solteiro, baseadas em letras de músicas de forró eletrônico ou de axé.

Tentaram ficar mais algumas vezes, logicamente sem compromisso, acabaram se encontrando em algumas baladas, mas no fim sempre saía briga e ela sempre saía chateada depois que ele dava uma investida em suas amigas. Falavam-se pouco ou quase nada nas redes sociais e nas de mensagens instantâneas. Ele, outro dia, fazendo uma “limpeza” em seu perfil a excluiu e postou em letras garrafais no início que só mantinha agora por lá os amigos; ela com despeito e em atitude desesperada, bloqueou e excluiu-o da rede de mensagens instantâneas.

Depois de seis intensos meses fazendo profundamente parte da vida um do outro, hoje, os dois cruzam-se na rua, reconhecem um o rosto do outro de algum lugar, mas sequer lembram o nome e nem de onde se conhecem, não dão importância ao fato, afinal sempre temos a impressão de conhecer as pessoas.

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